Palavras para a Minha Mãe
mãe, tenho pena. esperei sempre que entendesses
as palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz.
sei hoje que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente.
pelas palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste
tanto e eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te
desculpa, mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente.
às vezes, quero dizer-te tantas coisas que não consigo,
a fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia
mais bonita que tenho, gosto de quando estás feliz.
lê isto: mãe, amo-te.
eu sei e tu sabes que poderei sempre fingir que não
escrevi estas palavras, sim, mãe, hei-de fingir que
não escrevi estas palavras, e tu hás-de fingir que não
as leste, somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes.
José Luís Peixoto, in "A Casa, a Escuridão"
sábado, 29 de maio de 2010
quinta-feira, 27 de maio de 2010
POEMA
é a visita do tempo nos teus olhos,
é o beijo do mundo nas palavras
por onde passa o rio do teu nome;
é a secreta distância em que tocas
o princípio leve dos meus versos;
é o amor debruçado no silêncio
que te cerca e que te esconde:
como num bosque, lento, ouvimos
o coração de uma fonte não sei onde...
Vítor Matos e Sá, in 'Esparsos'
é o beijo do mundo nas palavras
por onde passa o rio do teu nome;
é a secreta distância em que tocas
o princípio leve dos meus versos;
é o amor debruçado no silêncio
que te cerca e que te esconde:
como num bosque, lento, ouvimos
o coração de uma fonte não sei onde...
Vítor Matos e Sá, in 'Esparsos'
segunda-feira, 24 de maio de 2010
15
ao entardecer
desta amargura
apanhei
quinze barcos
para longe
de todos os tempos
e só ficou foi a névoa
de querer abrir-me
em beijos
e sussurrar
ao mar
e ao teu peito
que nada me separa
do desejo
de te viver.
Ana Ventura
desta amargura
apanhei
quinze barcos
para longe
de todos os tempos
e só ficou foi a névoa
de querer abrir-me
em beijos
e sussurrar
ao mar
e ao teu peito
que nada me separa
do desejo
de te viver.
Ana Ventura
quarta-feira, 19 de maio de 2010
POEMA
As portas que batem
nas casas que esperam.
Os olhos que passam
sem verem quem está.
O talvez um dia
Aos que desesperam.
O seguir em frente.
O não se me dá.
O fechar os olhos
a quem nos olhou.
O não querer ouvir
quem nos quer dizer.
O não reparar
que nada ficou.
Seguir sempre em frente
E nem perceber.
Maria Judite de Carvalho
nas casas que esperam.
Os olhos que passam
sem verem quem está.
O talvez um dia
Aos que desesperam.
O seguir em frente.
O não se me dá.
O fechar os olhos
a quem nos olhou.
O não querer ouvir
quem nos quer dizer.
O não reparar
que nada ficou.
Seguir sempre em frente
E nem perceber.
Maria Judite de Carvalho
quinta-feira, 13 de maio de 2010
AMOR
Dois mil cigarros.
E uma centena de milhas
de parede a parede.
Uma eternidade e meia de vigílias
mais brancas do que a neve.
Toneladas de palavras
velhas como pegadas
de um ornitorrinco na areia.
Uma centena de livros que ficaram por escrever.
Uma centena de pirâmides que ficaram por construir.
Lixo.
Pó.
Amargo
como o princípio do mundo.
Acredita em mim quando digo
que foi belo.
Miroslav Holub
E uma centena de milhas
de parede a parede.
Uma eternidade e meia de vigílias
mais brancas do que a neve.
Toneladas de palavras
velhas como pegadas
de um ornitorrinco na areia.
Uma centena de livros que ficaram por escrever.
Uma centena de pirâmides que ficaram por construir.
Lixo.
Pó.
Amargo
como o princípio do mundo.
Acredita em mim quando digo
que foi belo.
Miroslav Holub
segunda-feira, 10 de maio de 2010
POR UM POETA
Ninguém se apaixona por um poeta
Porque um poeta não é constante
De mil coisas se veste,
Ainda que um dia cante
No outro é triste lamento
É lágrima seca p'lo vento
Ninguém se apaixona por um poeta
porque ele ama a natureza
E entristece com a certeza
Que a vida é toda incerteza!
Ninguém se apaixona por um poeta
Porque ninguém, não é pessoa!...
António Henrique Figueiredo
Porque um poeta não é constante
De mil coisas se veste,
Ainda que um dia cante
No outro é triste lamento
É lágrima seca p'lo vento
Ninguém se apaixona por um poeta
porque ele ama a natureza
E entristece com a certeza
Que a vida é toda incerteza!
Ninguém se apaixona por um poeta
Porque ninguém, não é pessoa!...
António Henrique Figueiredo
quinta-feira, 6 de maio de 2010
AI QUEM ME DERA
Ai, quem me dera terminasse a espera
Retornasse o canto simples e sem fim
E ouvindo o canto se chorasse tanto
Que do mundo o pranto se estancasse enfim
Ai, quem me dera ver morrer a fera
Ver nascer o anjo, ver brotar a flor
Ai, quem me dera uma manhã feliz
Ai, quem me dera uma estação de amor
Ah, se as pessoas se tornassem boas
E cantassem loas e tivessem paz
E pelas ruas se abraçassem nuas
E duas a duas fossem ser casais
Ai, quem me dera ao som de madrigais
Ver todo mundo para sempre afim
E a liberdade nunca ser demais
E não haver mais solidão ruim
Ai, quem me dera ouvir o nunca-mais
Dizer que a vida vai ser sempre assim
E, finda a espera, ouvir na Primavera
Alguém chamar por mim
Vinicius de Moraes
De Livro de letras
Retornasse o canto simples e sem fim
E ouvindo o canto se chorasse tanto
Que do mundo o pranto se estancasse enfim
Ai, quem me dera ver morrer a fera
Ver nascer o anjo, ver brotar a flor
Ai, quem me dera uma manhã feliz
Ai, quem me dera uma estação de amor
Ah, se as pessoas se tornassem boas
E cantassem loas e tivessem paz
E pelas ruas se abraçassem nuas
E duas a duas fossem ser casais
Ai, quem me dera ao som de madrigais
Ver todo mundo para sempre afim
E a liberdade nunca ser demais
E não haver mais solidão ruim
Ai, quem me dera ouvir o nunca-mais
Dizer que a vida vai ser sempre assim
E, finda a espera, ouvir na Primavera
Alguém chamar por mim
Vinicius de Moraes
De Livro de letras
domingo, 2 de maio de 2010
AS PALAVRAS DIRIGEM-SE UMAS ÀS OUTRAS
As palavras dirigem-se umas às outras:
dormentes nos dias cinzentos
acordam nos sonhos
mas acordam-nos dos sonhos
salvadoras-matadoras
roedoras de raízes
O seu alcance é
a vastidão erma do sentido
À flor do rio do olvido
o seu brilho
flutua fugaz no corpo da grafia
Ana Hatherly
dormentes nos dias cinzentos
acordam nos sonhos
mas acordam-nos dos sonhos
salvadoras-matadoras
roedoras de raízes
O seu alcance é
a vastidão erma do sentido
À flor do rio do olvido
o seu brilho
flutua fugaz no corpo da grafia
Ana Hatherly
Subscrever:
Mensagens (Atom)